26 outubro 2010

je suis comme je suis

«Je suis comme je suis
Je suis comme ça
Quand j’ai envie de rir
Oui je ris aux éclats
J’aime celui qui m’aime
Est-ce ma faute à moi
Si ce n’est pás le même
Que j’aime chaque fois
Je suis faite comm ça
Que voulez-vous de plus
Que voulez-vous de moi

Je suis faite pour plaire
Et n’y puis rien changer
Mes talons sont trops hauts
Ma taille trop cambrée
Mes seins beaucoup trop durs
Et mes yeux trop cernés
Et puis après
Qu’est-ce que ça peut vous faire
Je suis comme je suis
Je suis à qui me plais

Qu’est-ce que ça peut vous faire
Ce qui m’est arrivé
Oui j’ai aimé quelqu’un
Oui quelqu’un m’a aimée
Comme les enfants qui s’aiment
Simplement saven aimer
Aimer aimer…
Pourqoui me questioner
Je suis là pour vous plaire
Et n’y puis rien changer.»
Jacques Prévert, Paroles



il suffirait de preque rien
Serge Regianni



25 outubro 2010

a menina dança?

a intenção era queixar-me da mesquinhez das pessoas com que tenho lidado ao longo da vida, tentar partilhar algum do cansaço provocado pela hipocrisia que finjo não compreender, alguma autocomiseração, em suma, nada de verdadeiramente importante nem «de peso» como as deliciosas pinturas de Botero. 
É difícil não reagir à beleza, como é difícil não reagir à estupidez, mas à beleza é fácil render-me enquanto que a estupidez me cansa até à exaustão. 


18 outubro 2010

Ex- precisa-se?

Ex-editora. Ex-vice-presidente. Ex-chefe gabinete. Ex-controler. Ex-coordenadora de emissão. Ex-controladora operações comerciais. Ex-RP. Ex-directora-adjunta boletim cultural. Ex-redactora. Ex-copywriter. Ex-assistente editorial. Ex-RP e comunicação. Ex-account manager. Ex-assistente júri internacional de cinema. Ex-tradutora. Ex-escritora.

I don't think so...

breve história de uma ausência

Há dias em que a imagem de pessoas que já não estão comigo toma conta da minha memória e instala-se numa saudade quase insuportável. 
Perdi a minha amiga Teresa Costa há já tantos anos..., tínhamos uns 14 e estávamos ambas a estudar no Instituto Francês, actualmente designado Instituto Franco-Português, no Liceu Charles Lepierre, em Lisboa. Sempre que a sua cara sorridente olha para mim através da minha memória sinto-me tão triste, tão sozinha. Suicidou-se com apenas 14 anos, por causa da separação dos pais, e não só; atirou-se de um 8.º andar nos Olivais. Acho que nunca consegui recuperar a culpa de não ter estado ao lado dela na altura certa, se é que chegou a haver uma altura certa; talvez não tivesse conseguido fazer nada, o que é que sabíamos com os 14 anos daquela altura???? 
Mas lembro-me tão bem da cara dela, dos seus cabelos loiros escorridos, do seu olhar, que agora vejo nitidamente que era triste. 
Não sei porque me lembrei dela hoje, no caminho para casa, ao olhar para o fim do dia que passava pela janela, a correr, ou demasiado estático, só sei que a sua ausência instalou-se dentro de mim e vai magoar-me a noite que começa, vai de certeza torná-la mais longa e solitária.


09 outubro 2010

olhos que em breve não se encontram

«Sentia terrivelmente a falta dela.
Mas de repente sentiu-se a ser puxado, não sabia se para cima ou para baixo. Tudo o que sabia é que estava a ser arrastado para longe dela, e isso fê-lo gritar (mas não havia ar) e chorar (mas as lágrimas não podiam formar-se debaixo de água).» 
A Rapariga dos Pés de Vidro, Ali Shaw.
~

10 setembro 2010

olhar de génio

«I became a writer but when I was a boy
I used to dream of becoming the village idiot
I used to lie in bed and imagine myself that careless idiot,
planning ways to got food and sympathy easily,
planned confusion of not too much love or effort.
some would claim that I have succeded in this.» 
Charles Bukowski


08 setembro 2010

dedicatória


«Por exemplo. Há um cão vadio, sujo e com fome, cuida-se deste cão e ele deixa de ser vadio, deixa de estar sujo e deixa de ter fome. Até as crianças já lhe fazem festas.
Cuidaram do cão porque o cão não sabe cuidar de si – não saber cuidar de si é ser cão.
Ora eu não queria que cuidassem de mim, mas gostava que me ajudassem, para eu não estar assim, para que fosse eu o dono de mim, para que os que me vissem dissessem: Que bem que aquele soube cuidar de si!                                                                                                                      
*
Eu queria que os outros dissessem de mim: Olha um homem! Como se diz: Olha um cão! quando passa um cão; como se diz: Olha uma árvore! quando há uma árvore. Assim, inteiro, sem adjectivos, só de uma peça: Um homem!
*
Mas eu andei a procurar por todas as vidas uma para copiar e nenhuma era para copiar.» Almada Negreiros, A Invenção do Dia Claro.


um olhar, mil abismos

Dezembro, 2005

«Mas de repente toda a minha vida começou a decorrer à minha frente, como um flash, a ferir-me os olhos. E então não consegui mais esconder-te em mim e lembrei-me de ti. E a dor foi maior do que qualquer ser humano podia suportar. Toquei no rosto da mulher que me sorria, sonhadora e feliz, e tentei encontrá-la na minha cara e dentro de mim própria. Acariciei o teu rosto que olhava para mim, sonhador e feliz, tentei capturar o teu sorriso e alcançar o brilho do teu olhar. Fechei os olhos para melhor te sentir e quando os abri tu já lá não estavas.
E então desisti de tudo, deitei no chão o meu corpo dorido, e encolhi-me como quem se quer proteger do mundo, com as pernas bem encostadas ao peito e os ossos salientes dos joelhos a tocar-me o queixo.
Pousei a cara em cima do teu espaço vazio na fotografia e ali fiquei, à tua espera…». Maria Teresa Loureiro, Um Olhar, Mil Abismos



06 setembro 2010

ainda há quem escreva cartas de amor

«quero-te dizer que agora estou com sono, não porque seja tarde, pelo contrário, já amanheceu e eu acordei depois de uma noite em que quase não dormi. reli uma vez mais as tuas cartas, e decidi responder primeiro à última. como ensina o Evangelho - «responderás primeiro à última carta, só depois responderás à primeira.» (Livro Vinte5, 34,9). Deus seja louvado por todo o cuidado que pôs em definir regras de civilidade para bem escrever, ámen. mas prometo-te que amanhã tentarei responder às duas primeiras, e todos os dias que vierem, e nos meses e nos anos ainda por vir, tentarei sempre estar à altura de responder a todas as tuas solicitações, seja na forma de uma carte, de um olhar, de um gesto ou pedido; em resumo, seja qual for a forma que a tua presença assuma, quero estar lá pata ti, para mim, para nós. não tens que ter medo de me perder, e isto porque, no momento exacto fizeste essa magia de seres tu, esse feitiço encantador que a beleza sempre é; já me ganhaste, tens ganho todos os dias o prémio grande ou pequeno, bom ou nem por isso, do meu ser que por completo a ti se entrega. a resposta à tua carta está sintetizada na mensagem telefónica que ontem enviei, na raiz de tudo está esta nudez limpa que nos une, esta arrumação das horas e do mundo que vamos fazendo à nossa volta em função deste nós...»


05 setembro 2010

olhar à tua espera


«Ela era a única pessoa com quem queria partilhar a minha angústia e a necessidade da sua presença chegou a doer-me fisicamente. Queimava-me por dentro e nada nem ninguém me conseguia aliviar. Transformei-me numa figura cinzenta nos corredores. A minha sombra confundia-se com as paredes. Os dias caíam como folhas mortas.» Carlos Ruiz Zafón, Marina.



olhos em fusão

«Naquele dia, o fantasma de Gaudí esculpia no céu de Barcelona nuvens impossíveis sobre um azul que fundia o olhar.» Carlos Ruiz Zafón, Marina.



31 agosto 2010

olhares que deixam saudades 4




olhar no futuro


para a próxima vão elas, não vou eu, and good luck girls!

olhar ensonado


hoje foi só o que consegui arrancar-lhes... um valente bocejo. 

olhar diferenciador




há quem diga que as diferenças unem... Eu cá acho que as diferenças nos diferenciam, felizmente, na maioria das vezes.

olhar atento

Lisboa, 1964

olhar inclemente



«Descubro que o êxito e o fracasso são uma e a mesma cadeia e em tudo. O êxito para cima, o fracasso para baixo, e quando digo baixo, digo baixo: sujidões, dívidas, vergonhas, podridão, loucura. Mas o que torna tudo igual é que ambas as cadeias se encontram, nada a fazer, meus caros, daqui a cem anos ninguém se lembra.
E a nossa lição-abjecção a quem aproveitará?
Já tanto faz.
 Tanto nos faz.» Luiz Pacheco.

29 agosto 2010

olhar realista












«A arte de escrever histórias está no saber tirar das pequenas coisas, que se apanham da vida, todo o resto; mas acabada a página retorna-se à vida e apercebemo-nos de que o que sabíamos era o mesmo que nada.» Italo Calvino, O Cavaleiro Inexistente.

olhares que deixam saudades 3



28 agosto 2010

olhar escondido



tinhas razão quando me dizias que não devemos esconder aquilo que somos por muito doloroso que isso se possa tornar, para nós e para os outros.

olhos expectantes



«Happy families are all alike; every unhappy family is unhappy in its own way.» Leão Tolstoi, Ana Karenina.

27 agosto 2010

olhos que não vêem

abre os olhos e não reconhece de imediato o lugar onde se encontra; lembra-se de ter adormecido algures, a meio de uma frase do Philip Roth, mas está escuro à sua volta e não lhe parece credível ter estado tantas horas na praia. Deixara-se embalar pelo calor do Sol, antes de ter tido energia suficiente para se refrescar no mar, e agora o seu corpo queixa-se do frio… não faz sentido. Espreguiça-se e em vez da areia morna as suas mãos tiram algum prazer ao acariciarem a flanela fofa das almofadas e dos lençóis. Mantém os olhos fechados e lança-se num jogo de adivinhas para se entreter enquanto tenta recuperar o calor no corpo mexendo os dedos dos pés. Não lhe interessa saber se é de noite ou de dia, pelo menos naquele instante, já compreendeu que não está na praia, infelizmente, portanto o melhor que tem a fazer é prolongar o momento até que surja algum motivo que justifique pôr os pés de fora, não na areia, mas no chão de madeira.  

olhares cúmplices



duas caras sorriem, felizes, em jeito de cumplicidade, dois pares de olhos observam-me através de um passado que não consigo situar temporalmente.

olhos nos olhos



«Estás sempre comigo, sabes, acompanhas-me em todos os momentos da minha vida, embora ela agora só funcione a dez por cento. Mas quando funcionava a cem por cento como a tua, foi tão bonito, e foi tão grande a nossa paixão. Tão grande que as células do meu corpo ainda hoje estão impregnadas dela, como uma esponja que conserva a água salgada de que se alimentou. Porque depois, minha querida, depois foi só água doce, água chilra, quase sempre, e eu pergunto-me que sentido tem continuar a viver sem um grão de sol que estimule o meu paladar.» António Tabucchi, Está a Fazer-se Cada Vez Mais Tarde.

olhar no horizonte


«Chamar-te-ei e acenderemos uma fogueira e beberemos vinho e reconhecer-nos-emos no lugar que é o nosso. Não esperes. Não contes a história mais tarde.
A vida é tão curta. Esta extensão de mar e de areia, este passeio pela costa, antes de a maré cobrir tudo o que fizemos.
Eu amo-te.
As duas palavras mais difíceis do mundo.
Mas que posso eu dizer?» Jeanette Witerson, A Menina do Farol.

13 agosto 2010

olhar perdido

da gaveta de cima da mesa-de-cabeceira tira o caderno de escritas, que apenas tem escritos excertos de livros que ela vai lendo na esperança de que a ajudem a começar; a última frase, decalcada de um livro de Maria Zambrano, é particularmente sugestiva: «… escrever é defender a solidão em que se está.» Eu, por este andar, nunca vou defender a minha solidão, nem sequer livrar-me dela, diz para ninguém.

12 agosto 2010

olhar distanciado

repara na folha caída aos seus pés, está vazia. Suspira. Olha para o filme a preto e branco que passa na televisão a tempo de ver um Steve McQueen tão jovem que demora a reconhecê-lo; ele dá umas bofetadas a uma mulher triste que, apesar da dor que o esgar na sua cara faz depreender, não se afasta nem faz um gesto para se defender. Não gosta particularmente daquele actor, e depois de o ver esbofetear a mulher ainda menos, mas não lhe sobra vontade para procurar o comando e mudar de canal, sabe que é um esforço inútil, já que àquela hora os outros canais debitam filmes tão banais como novelas mexicanas.

11 agosto 2010

olhos que procuram

adivinha mais uma noite de delírio, em êxtase, a sentir-se dona de todos aqueles livros nas estantes que forram as paredes da sala; já os lera todos, alguns mais do que uma vez. Tem livros para reler até ao fim dos seus dias. É uma leitora compulsiva, lê tudo do princípio ao fim, por vezes como um sacrifício, mas nunca considera possível abandonar um livro antes de o ler até à última palavra. Nem sempre os digere, mas prefere uma paragem de digestão intelectual, causada por uma má história que admitir para si própria que não é capaz de levar a tarefa até ao fim.

09 agosto 2010

olhares que deixam saudades 2

domina com dificuldade as lágrimas que ondulam nos seus olhos, e que a todo o momento correm o risco de deslizar pela cara e de se perderem entre os lábios, que, indiferentes a uma dor que não é deles, desfrutam do prazer de um sabor a maresia trazida pelo vento. Tenta iludir as saudades das pessoas que lhe faltam, com gestos desajeitados para uma plateia inexistente ou talvez para si própria.

olhares que deixam saudades 1


«Resta-nos sempre o mar. E a memória. A gratidão de tudo o que é possível conquistar. Vermo-nos... Sabemos porquê...» 
Pedro Bandeira Freire, Rotas de Desejo.

08 agosto 2010

olhares capturados

«De onde estava sentada, observava o redondel do parque onde um homem e uma mulher posavam para o fotógrafo ambulante. Estavam de braços dados, ele arrumava a gravata, ela ajeitava o chapéu. O fotógrafo fazia sinais. O casal procurava uma posição: abraçados, de mãos dadas ou frente a frente? Por fim chegaram a um acordo: ela se apoiaria no ombro dele. Sorriam. Téc! O retrato estava tirado.»
Erico Veríssimo, Um Lugar ao Sol.

a tua pele

«Adoro a tua pele; uma pele como hálito, móvel e doce. Quando te toco, a tua pele estremece duas vezes [...].» 
Jeanette Winterson, A Menina do Farol.


07 agosto 2010

e por si se move

«Com o ligeiro tremor de terra que abalara a cidade de Lisboa, a perna de presunto desprendera-se da cunha que a sustinha no ar - um pouso para moscas. Na sua queda vertical o peso morto rasgara o espaço, e com um efeito de guilhotina decapitara o taberneiro Pépe, cuja cabeça, rolando pela banca até cair na panela ebuliente, forcejara com língua, nariz e dentes, para alterar a rota da trajectória. Pouco depois caíram as cebolas, que entrelaçadas tinham pendido também na trave arqueada. A sopa fez-se.
Notificando o insólito caso de acefalia às autoridades competentes, a mulher serviu, nessa noite ao jantar, sopa a amigos e familiares.» 
Carlo Magalhães Ruas, in Oficina de Poesia, Março de 2002.

olhar o vazio

nada altera a crueza da solidão que a rodeia. Fica a olhar para o vazio, com os zumbidos nos ouvidos; prefere não regressar às suas introspecções monocórdicas, por experiência sabe que com o passar das horas têm uma tendência egocêntrica para se tornarem cada vez mais sombrias.

06 agosto 2010

olhos que sonham...

fecha os olhos e deseja, com todas as forças da mente e alguma ajuda do corpo que se retesa, ouvir a porta da rua abrir; apura o ouvido com teimosia, tentando adivinhar para além dos sons que impregnam o seu cérebro. Quer acreditar que se desejar com insistência consegue adiantar o regresso dela à casa que é a deles.