08 setembro 2010

dedicatória


«Por exemplo. Há um cão vadio, sujo e com fome, cuida-se deste cão e ele deixa de ser vadio, deixa de estar sujo e deixa de ter fome. Até as crianças já lhe fazem festas.
Cuidaram do cão porque o cão não sabe cuidar de si – não saber cuidar de si é ser cão.
Ora eu não queria que cuidassem de mim, mas gostava que me ajudassem, para eu não estar assim, para que fosse eu o dono de mim, para que os que me vissem dissessem: Que bem que aquele soube cuidar de si!                                                                                                                      
*
Eu queria que os outros dissessem de mim: Olha um homem! Como se diz: Olha um cão! quando passa um cão; como se diz: Olha uma árvore! quando há uma árvore. Assim, inteiro, sem adjectivos, só de uma peça: Um homem!
*
Mas eu andei a procurar por todas as vidas uma para copiar e nenhuma era para copiar.» Almada Negreiros, A Invenção do Dia Claro.


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