31 agosto 2010

olhares que deixam saudades 4




olhar no futuro


para a próxima vão elas, não vou eu, and good luck girls!

olhar ensonado


hoje foi só o que consegui arrancar-lhes... um valente bocejo. 

olhar diferenciador




há quem diga que as diferenças unem... Eu cá acho que as diferenças nos diferenciam, felizmente, na maioria das vezes.

olhar atento

Lisboa, 1964

olhar inclemente



«Descubro que o êxito e o fracasso são uma e a mesma cadeia e em tudo. O êxito para cima, o fracasso para baixo, e quando digo baixo, digo baixo: sujidões, dívidas, vergonhas, podridão, loucura. Mas o que torna tudo igual é que ambas as cadeias se encontram, nada a fazer, meus caros, daqui a cem anos ninguém se lembra.
E a nossa lição-abjecção a quem aproveitará?
Já tanto faz.
 Tanto nos faz.» Luiz Pacheco.

29 agosto 2010

olhar realista












«A arte de escrever histórias está no saber tirar das pequenas coisas, que se apanham da vida, todo o resto; mas acabada a página retorna-se à vida e apercebemo-nos de que o que sabíamos era o mesmo que nada.» Italo Calvino, O Cavaleiro Inexistente.

olhares que deixam saudades 3



28 agosto 2010

olhar escondido



tinhas razão quando me dizias que não devemos esconder aquilo que somos por muito doloroso que isso se possa tornar, para nós e para os outros.

olhos expectantes



«Happy families are all alike; every unhappy family is unhappy in its own way.» Leão Tolstoi, Ana Karenina.

27 agosto 2010

olhos que não vêem

abre os olhos e não reconhece de imediato o lugar onde se encontra; lembra-se de ter adormecido algures, a meio de uma frase do Philip Roth, mas está escuro à sua volta e não lhe parece credível ter estado tantas horas na praia. Deixara-se embalar pelo calor do Sol, antes de ter tido energia suficiente para se refrescar no mar, e agora o seu corpo queixa-se do frio… não faz sentido. Espreguiça-se e em vez da areia morna as suas mãos tiram algum prazer ao acariciarem a flanela fofa das almofadas e dos lençóis. Mantém os olhos fechados e lança-se num jogo de adivinhas para se entreter enquanto tenta recuperar o calor no corpo mexendo os dedos dos pés. Não lhe interessa saber se é de noite ou de dia, pelo menos naquele instante, já compreendeu que não está na praia, infelizmente, portanto o melhor que tem a fazer é prolongar o momento até que surja algum motivo que justifique pôr os pés de fora, não na areia, mas no chão de madeira.  

olhares cúmplices



duas caras sorriem, felizes, em jeito de cumplicidade, dois pares de olhos observam-me através de um passado que não consigo situar temporalmente.

olhos nos olhos



«Estás sempre comigo, sabes, acompanhas-me em todos os momentos da minha vida, embora ela agora só funcione a dez por cento. Mas quando funcionava a cem por cento como a tua, foi tão bonito, e foi tão grande a nossa paixão. Tão grande que as células do meu corpo ainda hoje estão impregnadas dela, como uma esponja que conserva a água salgada de que se alimentou. Porque depois, minha querida, depois foi só água doce, água chilra, quase sempre, e eu pergunto-me que sentido tem continuar a viver sem um grão de sol que estimule o meu paladar.» António Tabucchi, Está a Fazer-se Cada Vez Mais Tarde.

olhar no horizonte


«Chamar-te-ei e acenderemos uma fogueira e beberemos vinho e reconhecer-nos-emos no lugar que é o nosso. Não esperes. Não contes a história mais tarde.
A vida é tão curta. Esta extensão de mar e de areia, este passeio pela costa, antes de a maré cobrir tudo o que fizemos.
Eu amo-te.
As duas palavras mais difíceis do mundo.
Mas que posso eu dizer?» Jeanette Witerson, A Menina do Farol.

13 agosto 2010

olhar perdido

da gaveta de cima da mesa-de-cabeceira tira o caderno de escritas, que apenas tem escritos excertos de livros que ela vai lendo na esperança de que a ajudem a começar; a última frase, decalcada de um livro de Maria Zambrano, é particularmente sugestiva: «… escrever é defender a solidão em que se está.» Eu, por este andar, nunca vou defender a minha solidão, nem sequer livrar-me dela, diz para ninguém.

12 agosto 2010

olhar distanciado

repara na folha caída aos seus pés, está vazia. Suspira. Olha para o filme a preto e branco que passa na televisão a tempo de ver um Steve McQueen tão jovem que demora a reconhecê-lo; ele dá umas bofetadas a uma mulher triste que, apesar da dor que o esgar na sua cara faz depreender, não se afasta nem faz um gesto para se defender. Não gosta particularmente daquele actor, e depois de o ver esbofetear a mulher ainda menos, mas não lhe sobra vontade para procurar o comando e mudar de canal, sabe que é um esforço inútil, já que àquela hora os outros canais debitam filmes tão banais como novelas mexicanas.

11 agosto 2010

olhos que procuram

adivinha mais uma noite de delírio, em êxtase, a sentir-se dona de todos aqueles livros nas estantes que forram as paredes da sala; já os lera todos, alguns mais do que uma vez. Tem livros para reler até ao fim dos seus dias. É uma leitora compulsiva, lê tudo do princípio ao fim, por vezes como um sacrifício, mas nunca considera possível abandonar um livro antes de o ler até à última palavra. Nem sempre os digere, mas prefere uma paragem de digestão intelectual, causada por uma má história que admitir para si própria que não é capaz de levar a tarefa até ao fim.

09 agosto 2010

olhares que deixam saudades 2

domina com dificuldade as lágrimas que ondulam nos seus olhos, e que a todo o momento correm o risco de deslizar pela cara e de se perderem entre os lábios, que, indiferentes a uma dor que não é deles, desfrutam do prazer de um sabor a maresia trazida pelo vento. Tenta iludir as saudades das pessoas que lhe faltam, com gestos desajeitados para uma plateia inexistente ou talvez para si própria.

olhares que deixam saudades 1


«Resta-nos sempre o mar. E a memória. A gratidão de tudo o que é possível conquistar. Vermo-nos... Sabemos porquê...» 
Pedro Bandeira Freire, Rotas de Desejo.

08 agosto 2010

olhares capturados

«De onde estava sentada, observava o redondel do parque onde um homem e uma mulher posavam para o fotógrafo ambulante. Estavam de braços dados, ele arrumava a gravata, ela ajeitava o chapéu. O fotógrafo fazia sinais. O casal procurava uma posição: abraçados, de mãos dadas ou frente a frente? Por fim chegaram a um acordo: ela se apoiaria no ombro dele. Sorriam. Téc! O retrato estava tirado.»
Erico Veríssimo, Um Lugar ao Sol.

a tua pele

«Adoro a tua pele; uma pele como hálito, móvel e doce. Quando te toco, a tua pele estremece duas vezes [...].» 
Jeanette Winterson, A Menina do Farol.


07 agosto 2010

e por si se move

«Com o ligeiro tremor de terra que abalara a cidade de Lisboa, a perna de presunto desprendera-se da cunha que a sustinha no ar - um pouso para moscas. Na sua queda vertical o peso morto rasgara o espaço, e com um efeito de guilhotina decapitara o taberneiro Pépe, cuja cabeça, rolando pela banca até cair na panela ebuliente, forcejara com língua, nariz e dentes, para alterar a rota da trajectória. Pouco depois caíram as cebolas, que entrelaçadas tinham pendido também na trave arqueada. A sopa fez-se.
Notificando o insólito caso de acefalia às autoridades competentes, a mulher serviu, nessa noite ao jantar, sopa a amigos e familiares.» 
Carlo Magalhães Ruas, in Oficina de Poesia, Março de 2002.

olhar o vazio

nada altera a crueza da solidão que a rodeia. Fica a olhar para o vazio, com os zumbidos nos ouvidos; prefere não regressar às suas introspecções monocórdicas, por experiência sabe que com o passar das horas têm uma tendência egocêntrica para se tornarem cada vez mais sombrias.

06 agosto 2010

olhos que sonham...

fecha os olhos e deseja, com todas as forças da mente e alguma ajuda do corpo que se retesa, ouvir a porta da rua abrir; apura o ouvido com teimosia, tentando adivinhar para além dos sons que impregnam o seu cérebro. Quer acreditar que se desejar com insistência consegue adiantar o regresso dela à casa que é a deles.